"... cada pessoa tem em mente uma cidade feita exclusivamente de diferenças,
uma cidade sem figuras e sem forma,
preenchida pelas cidades particulares."
Italo Calvino em As cidades invisíveis
Costuma-se dizer que um lugar é o espaço que possui uma história, uma teia de relações e uma identidade dada, em um momento. Isso se dá, principalmente, pelos acontecimentos anteriores e atuais envolvendo o referido espaço. Mas, segundo muitos pesquisadores das Ciências Sociais, também existem espaços que não tem história, desprovidos de processos identitários próprios. Neles a teia de relações que se forma acaba tornando-os não lugares.
Os não lugares acabam se transformando em espaços alheios à cultura e aos costumes locais. Assim, é comum vermos cotidianamente um cenário, mas, em função de ele ter pouca ligação com o cotidiano de fato, acaba não sendo visto, não fazendo parte efetiva da paisagem sensível dos moradores, dos transeuntes e dos turistas. Esses últimos já são, por natureza, visitadores de não lugares locais. O estrangeiro vem ver o que o local não vê com os mesmos olhos ou não quer enxergar.
Foz do Iguaçu é conhecida pela sua beleza natural. É uma informação tão forte que até mesmo os moradores da cidade acabam não conseguindo ver as outras “atrações” que existem. A Igreja de São Francisco de Assis é uma delas. Situada no bairro Morumbi ela é considerada mais bela e mais imponente que a catedral do centro da cidade. Motivo de orgulho para os moradores, mesmo os que nem são católicos, a igreja é, para a maioria da cidade, um não lugar.
O olhar é um tipo de registro físico e espiritual. Não se pode dizer que as imagens da nossa vida são gravadas apenas no nosso intelecto. Talvez por esse motivo algumas pessoas passem todos os dias por verdadeiros monumentos e não dão muita importância.
Pois se a igreja de São Francisco de Assis no bairro Morumbi é pouco notada e quase não faz parte do cotidiano olhar da maioria dos habitantes de Foz do Iguaçu, o eu dizer dos monumentos menores, aqueles que estão distribuídos pelas ruas? A corujinha que está na avenida JK, próximo ao Terminal de ônibus (TTU) é outro exemplo.
É praticamente impossível não vê-la, mas registrá-la no olhar e bem mais difícil. O registro fica mais difícil porque não há nenhuma placa explicativa ou mesmo um vínculo com a sua natureza. Por que ela está naquele local? Homenageia quem?
Para uma cidade turística, Foz do Iguaçu carece de mais informação. Muitas vezes os visitantes trazem mais detalhes sobre os monumentos da cidade do que os próprios iguaçuenses.
O que acontece com a corujinha da JK pode ser notado até mesmo nas vias principais de Foz. Na avenida Brasil, que sofreu uma grande reforma recentemente, poucos sabem o significado das grandes bolas colocadas nas esquinas. Tampouco se dá atenção ao conjunto de bandeiras dos países que compõem o Mercosul quando a Brasil cruza avenida Jorge Schimmelpfeng. Ali não há nem mesmo uma explicação sobre quem foi Jorge Schimmelpfeng.
O turismo é uma das principais fontes de arrecadação do município de Foz do Iguaçu, senão a maior. Se os monumentos e valores sociais do local não são conhecidos pela própria comunidade e os serviços públicos não têm nenhuma política para diminuir esse problema, vai ficar cada vez mais difícil encontrar um morador que saiba explicar onde fica um local como a igreja de São Francisco de Assis.
Como a simbolização mais representativa da coruja é a sabedoria, talvez fosse o caso de mudá-la de local, deixando aquele marco da cidade mais próximo ao centro administrativo. Quem sabe a proximidade possa fazer com que as autoridades comecem a dar sábios passos para ampliar ou criar uma identidade iguaçuense e uma melhor divulgação dos monumentos e valores históricos desse município quase centenário.
Obra consultada:
Marcia Maria Cavalcanti, “O fetiche do consumo como agente de reprodução do não-lugar” IN: http://www.revistaturismo.com.br/artigos/nao-lugar.html (acessado em 15/9/07)
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